Atenção o texto que se segue é sobre apreciar tudo, só que também as coisas más. E a morte é algo muito difícil de apreciar. O texto que se segue é algo macabro (tipo filme de terror), se não estão na onda NÃO leiam pois não ganharão nada com isso...



A propósito de uma conversa trivial (sobre o significado original de `saved by the bell') acabei por fazer uma investigação na web sobre as pessoas que são
(inadvertidamente) enterradas vivas. Imaginem o que é,
acordar num caixão, dois metros abaixo do solo, sem espaço
para se mexer, o ar a acabar, os membros presos, `sem
saída'. Nunca ninguém vai sequer saber que chegou a
acontecer (o caixão apodrece sem deixar marcas), os nossos familiares nem saberão que chegámos a acordar. Sozinhos, sós, frente a frente com a morte, e o corpo a querer voltar à vida, a tornear, a respirar, a querer quebrar a casca que o separa de tudo o que lhe é querido. Voltar à vida...



Impossível... estamos face a face à morte, só ela nos
espera, só ela está ali, para nos levar, para nos dissolver.
O corpo tem que ser abandonado, agora que já não há espaço
para ele. Mas ele não quer ir... mexe-se sozinho, impulsivamente, descontroladamente, os membros contra o caixão, os pulmões procurando o ar fresco, a voz procurando os ouvidos dos outros, que ninguém está lá...



...



É preciso amar o corpo. Usar reiki sobre ele e dizer-lhe o quanto apreciámos a sua ajuda. É hora de partir... É hora de amar intensamente tudo o que vivemos, recordar as pessoas, as ocasiões, os ensinamentos... o coração acelera, já sem ar, é altura de dizer o quanto o amámos... Despedimo-nos suavemente, lentamente. Sentimos as veias a explodir, o suor, o sangue na língua, na boca, o revirar os olhos, a asfixia final... todo o corpo implode sobre o sofrimento da saudade e da revolta, de mais um dia, mais um sol, mais uma gota de água... mas foi tão bom enquanto durou... foi tão bom... foi tão bom...



E é o outro lado... É o amor... o caixão serviu de veículo,
de nave espacial, um último momento de reflexão, um último momento a sós com a vida e com o que ela nos deixou e legou, um último momento de carinho para com o corpo. É preciso amar o corpo, pois a sua sede de vida é também uma busca de reconhecimento por tudo o que ele nos deu. E agora, que está tudo feito, é preciso morrer... e deixar o espírito e tudo livre para novas aventuras... se elas houver!!!



Mais informação:

<http://www.snopes.com/horrors/gruesome/buried.htm>
http://www.snopes.com/horrors/gruesome/buried.htm



"To die is natural; but the living death

Of those who waken into consciousness,

Though for a moment only, ay, or less,

To find a coffin stifling their last breath,

Surpasses every horror underneath

The sun of Heaven ..."



"SÁBIO É O QUE SE CONTENTA COM O ESPECTÁCULO DO MUNDO"
Ricardo Reis (F.
Pessoa)



E é isto estar na barriga do tigre... (ver o meu mail
anterior)

 

-- (resposta a alguns mails que entretanto surgiram na lista a este respeito:)

 

 

-----Original Message-----
From: Pedro Fonseca [mailto:pf@pedro-fonseca.com]
Sent: Wednesday, May 28, 2003 4:13 PM
To: kung-fu-toa@yahoogroups.com
Subject: RE: [kung-fu-toa] Morte parte II/2

 

Boas!!

 

Notem que o que é importante para nós (enquanto seres mortais) é a aceitação da morte, e isto porque quando nos dedicamos às coisas temos tanto medo que elas desapareçam, que podemos até tentar negar que a morte exista (por vezes a ‘vida depois da morte’, ‘ficar na história’, trabalho, filhos, cyborgs, game boys, etc servem esse propósito). O que eu disse no meu outro mail é que ao aceitar o horror da morte como algo real, algo que eu vou mesmo sofrer, abriram-se as portas para uma imagem linda da vida. Uma imagem onde o medo de errar é menos importante do que a vontade de viver plenamente. Isto para mim funciona porque sou muito perfeccionista: muitas vezes não ajo porque tenho medo de falhar, mas já que vou ser derrotado, plenamente e totalmente em todas as minhas ambições, já não há problema se falhar: o falhanço está garantido, o resto antes dele é que é incerto. E, como também tenho muito medo da morte, ao aceitar que ela vai mesmo vir, penso que, se vou ter de a enfrentar, importa viver cada momento que a antecede com júbilo, como aquilo que é: único, precioso, e saborear tudo o que ele tem para dar.

 

Isto não significa que a morte seja menos horrível, pelo contrário, é precisamente por ser tão horrível que gosto tanto da vida, é precisamente por ser ‘a derrota total’ que me permite arriscar tudo sem ter medo de nada. Será que sem este ‘peso’ este ‘horror’ da morte ainda consideraria a vida tão bela e leve? Será que se estivesse aprisionado no tempo (se não pudesse morrer mesmo que quisesse) teria ainda tanto apego à vida? Não sei, talvez o que interesse seja apenas o sentimento de liberdade, a possibilidade de criar e viajar, e talvez isso baste para nos alimentar durante milhares, milhões, milhares de milhões de milhões de milhões de anos, e mais, muito mais... talvez, mas eis algo que escrevi:

 

“A vida e a morte, a morte e a vida, juntaram-se as duas à esquina, e mesmo sem concertina puseram-se a cantar:

 

Como é bela a vida

As estrelas e o sol

E amanhã será um novo dia

Cheio de agradecimento

Por mais um sol que desperta

E de temor

Pelo dia que virá

Em que tudo terá um fim...”

 

Enfim (estas patacoadas)...

To’A

p.